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História, tradição e vontade de ganhar dinheiro tornam Itabaiana uma referência em negócios

Atualizado: 12 de mai.

Por Janisse Bispo, Janaína Cavalcante, Júlia Cavalcante, Heidy Souza

 

Foto: Júlia Cavalcante


O pedido da avó e o amor pelos doces são alguns dos motivos que levaram a comerciante Leila Costa a se dedicar à produção de bolos. A empreendedora, de 41 anos, nasceu em uma família de comerciantes, mas sem vínculo com a produção de alimentos. Dos pais, que trabalham na indústria de gesso, ela herdou a vontade de ter o próprio negócio, mas sua jornada seguiu por um caminho diferente.


Durante a pandemia de Covid-19, Leila transformou o passatempo em uma das principais fontes de renda da casa. Formada em Design de Interiores e Letras-Português, foi na cozinha, experimentando novas maneiras de fazer receitas de bolos e doces, que ela decidiu criar o empreendimento “Bolos da Isa”, uma homenagem à filha que se chama Isadora.


Para Leila, manter o seu próprio negócio de pé vai muito além de conseguir ganhar o sustento: significa levar adiante a herança deixada por sua avó. “Foi um pedido muito significativo da minha avó, me dizendo que mesmo que me ofereçam dinheiro, as nossas receitas jamais poderiam ser vendidas, pois é uma tradição nossa e deveria ser passada aos mais novos. E assim, estou seguindo o desejo dela, ensinando a minha filha para que não percamos essa tradição”, conta, emocionada.


Assim como Leila, outros comerciantes de Itabaiana escolheram a profissão pelo mesmo motivo. Além da dimensão familiar, contudo, há também um vínculo entre a cidade e as negociações, como afirma o historiador Carlos Mendonça ao dizer quea identidade do município está assentada em um desenvolvimento com base no comércio local”. “Eles sabem negociar e vender, a ótica deles é evoluir sempre e isso acaba se tornando uma referência", acrescenta.


A tradição familiar é uma marca registrada no comércio de Itabaiana.

Fotos: Janisse Bispo e Janaína Cavalcante


De acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Itabaiana possui um total de 103.439 habitantes, enquanto registra pouco mais de 1.500 comércios formais, segundo a Secretaria Municipal de Indústria e Comércio. Estes números fazem com que o município tenha, em média, um estabelecimento comercial formalizado para cada 64 habitantes. Ainda sem contar os negócios informais, a secretaria também informa que o comércio corresponde a 70% da economia local e gera 5 mil empregos diretos.


O 'ESPÍRITO EMPREENDEDOR' DA CAPITAL SERGIPANA DO COMÉRCIO


Mesmo com a grande quantidade de empresas, a relação entre Itabaiana e o comércio costuma ser atribuída a razões de identidade, com destaque para o espírito empreendedor e a facilidade da população para os negócios. “Há décadas Itabaiana mantém a posição de maior comércio das cidades do interior de Sergipe, e tem a fama de ter um povo com espírito empreendedor muito forte”, aponta Ivanilda Silva, professora do curso de Administração da Universidade Federal de Sergipe, no Campus de Itabaiana.


Itabaiana é conhecida por suas produções agrícolas de cebola, batata, mandioca e castanha, mas também não podemos esquecer do seu comércio, que atravessa fronteiras e encontra eco nos quatro cantos de Sergipe.


O bom desempenho comercial e a tradição fizeram com que a Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese) aprovasse um projeto de lei que torna Itabaiana a “Capital Sergipana do Comércio”. A variedade de produtos desenvolvidos e beneficiados na cidade, como o bolachão, a castanha e a farinha, contribui para manter o mercado consumidor muito consistente, mas o que determina o selo de qualidade dos produtos é o dito “espírito empreendedor”.


Para João Cícero, costureiro e proprietário da Casa de Costura de Itabaiana, comércio dedicado ao reparo de máquinas há mais de 20 anos, o sucesso comercial da cidade se deve ao gosto pelo trabalho e pela disposição para ajudar outros trabalhadores. “Muita gente trabalha de mau gosto e nós itabaianenses somos diferentes disso. A gente faz o nosso serviço com um sorriso no rosto”, pontua. Para ele, a vontade de trabalhar também explica a variedade do comércio. “Itabaiana tem de tudo, o povo de Itabaiana é curioso”.


O historiador Carlos Mendonça explica que o comércio do local nasceu com a venda de gado em 1612, quando Itabaiana ainda era apenas um distrito provinciano e fornecia grande quantidade de bois para as capitanias da Bahia e de Pernambuco. Foi somente na segunda metade do século XIX que a atividade entrou em evidência, após a criação da primeira feira livre em Laranjeiras.


De acordo com a secretária de Indústria e Comércio, Sônia Maria de Carvalho, o comércio da cidade é construído pelas mãos do povo, o que atesta o espírito comercial da população. “Mesmo que encontre algum itabaianense fora da região, ele estará empreendendo e sendo gentil e compreensível com o seu cliente”, enfatiza.


Vocação e vontade de ganhar dinheiro faz a cidade ser referência nos quatro cantos de Sergipe.

Fotos: Janisse Bispo e Janaína Cavalvante


O COMÉRCIO INFORMAL E A SEGURANÇA DOS TRABALHADORES


Para além dos negócios formais, na cidade há também uma série de trabalhadores autônomos, que não possuem registro no CNPJ. O cenário em Itabaiana não é diferente ao do restante do país. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a taxa de informalidade para o Brasil ultrapassou os 39% no segundo trimestre de 2023. Em Sergipe, o índice é de 51%. Como consequência, a informalidade gera não só uma redução da arrecadação do município, mas também insegurança para os trabalhadores-empreendedores.


Já no caso dos trabalhadores, a professora Ivanilda Silva cita como maiores consequências da informalidade a imprevisibilidade da renda, o que dificulta o planejamento financeiro, e a falta de segurança. “O trabalhador informal não tem nenhum tipo de proteção de seguridade social, portanto, se ele adoece, por exemplo, não tem como manter a si próprio e a sua família, enquanto persistir o problema de saúde. Então, isso traz uma insegurança muito grande em relação ao futuro do trabalhador e também do seu núcleo familiar”.


Em 2008, o Congresso Nacional fez mudanças na Lei das Micro e Pequenas Empresas e criou o MEI, um registro profissional simplificado para os microempreendedores individuais. A contrapartida para os autônomos que se formalizam é o direito a alguns benefícios trabalhistas como a aposentadoria e o direito ao auxílio-doença.


Ainda assim, alguns trabalhadores resistem ao registro no MEI. Entre as questões que podem comprometer a formalização, está a falta de atração do benefício da aposentadoria e as restrições impostas aos empreendedores, que ficam proibidos de ter sócios e administrar empresas de terceiros.


Leila, a doceira que conhecemos no início da reportagem, ainda não é cadastrada no MEI. Ela diz que, apesar de trabalhar há bastante tempo informalmente, tem planos de formalizar o seu negócio para ter mais segurança. “No futuro, quero montar a minha confeitaria e eu gostaria de me cadastrar, acho importante para nós, que estamos começando, termos uma segurança no trabalho”, pontua.


“Sem dúvidas a capacidade empreendedora do povo itabaianense é impressionante, isso mantém a força do comércio local, fortalecendo a economia da cidade”, observa a professora Ivanilda Silva, ressaltando que o MEI é um benefício que contribui para a economia local de forma geral.


Buscar o maior número de informações possíveis e após isso, pesar os prós e contras para decidir se o cadastro no MEI é vantajoso ou não, é uma decisão que cabe apenas ao trabalhador autônomo. Com esta reportagem, tentamos levar o público a pensar na segurança desses trabalhadores e a não romantizar as capacidades empreendedoras do povo itabaianense.


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