top of page

Comércio do ouro gera 12% da renda anual de Itabaiana

Por Laura Marcelino, Giulia Meneses e Maddu Macedo

 

Foto: Giulia Meneses

No estado de Sergipe, a cidade de Itabaiana tornou-se uma referência devido ao seu desenvolvimento econômico e social. Dados publicados pela gestão municipal apontam que Itabaiana bateu recorde ao arrecadar aproximadamente R$ 49 mil em 2023, um valor importante para o fortalecimento do potencial econômico do município. No ano anterior, o valor arrecadado atingiu a casa dos R$47 mil, 7 mil a mais que no ano de 2021. Já o setor varejista e atacadista de jóias e semijoias na maior cidade do interior do estado, se consolida como um dos principais contribuintes da economia local, segundo a Secretaria Municipal de Indústrias e do Comércio, Itabaiana gera cerca de 12% da renda anual.


Em nível nacional, o mercado de jóias, folheados e bijouterias vem se adequando cada vez mais ao seus respectivos públicos-alvo e segue firme como um dos setores mais lucrativos do Brasil. Um relatório do Mercado de Joias no Brasil estima um crescimento de 1,79% no mercado brasileiro de jóias até 2027, fazendo com que seu impacto econômico persista por muito tempo. E Itabaiana, a maior cidade do interior sergipano, segundo o Censo 2022 divulgado pelo IBGE, também faz parte desse cenário nacional. De acordo com dados do Diretório Brasil, atualmente na cidade existem 47 empresas ativas no comércio de jóias e relógios.


No quesito geração de empregos, esse mercado representa, sobretudo, uma fonte de renda para os moradores de Itabaiana. De acordo com Sônia Maria de Carvalho, Secretária Municipal de Indústrias e do Comércio, são mais de 400 empregos gerados a partir da comercialização do ouro e outros 700 relacionados à fabricação de jóias, semijóias e folheados.

Para os itabaianenses, contudo, a relação com o ouro não se resume aos números. Uma simples caminhada pelas ruas da cidade mostra que o apego ao metal precioso ultrapassa a dimensão material e encontra lugar de referência no imaginário popular. Quando ouvimos de moradores que Itabaiana é a capital do ouro, logo imaginamos uma terra com estrutura para abrigar minas de produção da pepita. Mas, não existe nada disso.


O que muito se pergunta é como o município serrano adquiriu o status de capital do ouro sem ao menos produzi-lo. No entanto, não existe uma resposta exata sobre como a cidade tornou-se símbolo da presença do metal precioso. De acordo com Phellipe Cunha em sua tese “Expansão urbana e centralidades locais em Itabaiana", a fama de cidade do ouro teria começado no início da década de 1980, devido ao comércio abrangente criado a partir das feiras livres. O geógrafo sergipano Sérgio Ricardo Santana, por sua vez, apresenta outra versão: “Antigamente, as pessoas que vendiam ouro em Itabaiana colocavam um preço baixo para atrair clientes, e pouco a pouco iam construindo o seu negócio. Hoje, muitas pessoas vão lá pela fama e pela questão fiscal. Muitas vezes, é possível comprar as peças sem imposto e sem nota, o que facilita a compra e venda”, explica.


Mesmo após mais de 40 anos da origem da fama do comércio de jóias, esse intenso comércio varejista e atacadista da cidade, e grande parcela do lucro obtido, são graças a comerciantes e consumidores não só da cidade, mas também de várias localidades de outros estados do país. Não é atoa que andando pelo centro, é possível encontrar na rua Barão do Rio Branco, muitas opções de lojas de compra e venda de ouro, como exemplo da Mesquita Jóias, fundada por um dos ourives mais antigos da cidade. Para saber mais da história desse profissional que domina o ofício a mais de 40 anos, assista os web stories “Elisabeth e Mesquita: amor, ouro e tradição”.


Seja na banca da feira ou na vitrine, Itabaiana respira ouro. Foto: Giuilia Meneses


Quando dizemos que Itabaiana é a capital do ouro, normalmente as pessoas imaginam um território com uma vasta disponibilidade de materiais preciosos e minas, mas não é essa a realidade geográfica da região. No Brasil existem três tipos de estruturas geológicas: os escudos cristalinos, também conhecidos como maciços antigos, estruturas onde são encontrados minerais metálicos, entre eles o ouro; as bacias sedimentares, onde estão presentes o petróleo, xisto, carvão, entre outras coisas; e, por fim, os dobramentos modernos, formados pelas grandes cadeias montanhosas, que de maneira geral são pobres em minerais devido a sua formação recente.


O geógrafo Sérgio Santana explica ainda, que apesar de Itabaiana ter uma parcela de escudos cristalinos em seu território, com rochas magmáticas e, principalmente, metamórficas, esse escudo não é rico em minerais valiosos como o ouro. Dessa forma, nota-se que a fama de cidade do ouro se consolida em Itabaiana pelo dom de comércio dos itabaianenses, como é o caso de Wesley dos Santos Santana, que atua no ramo que já é uma tradição em sua família. O filho de Elisabeth e Seu Mesquita, se espelhou no próprio pai no momento de montar seu negócio de produção e compra e venda de ouro. Entre os produtos mais vendidos, as alianças e os anéis de formatura de Itabaiana são uma referência em todo o estado e a busca pelas peças atraem compradores de cidades vizinhas, principalmente de Aracaju. “As alianças são as campeãs de venda. Quase toda semana tem alguém daqui mesmo ou da capital querendo um par delas”, afirma o comerciante.


As alianças são líder de vendas na loja do Seu Mesquita. Foto: Maddu Macedo


RELAÇÃO COM A CAPITAL


A imagem de capital do ouro, construída nacionalmente, tem atraído brasileiros dos quatro cantos do país para comprar joias, e contribuem, por consequência, para fortalecer laços entre grandes centros comerciais, como ocorre entre Aracaju e Itabaiana. É impossível não ouvir alguns dos ourives espalhados pelo Calçadão da Rua João Pessoa, no centro da capital sergipana, fazer referência à cidade do agreste quando o assunto é “ouro do bom”. Mesmo com o vai e vem das pessoas que passam pelo calçadão, um dos pontos mais conhecidos dos aracajuanos, não há quem deixe de observar trabalhadores anunciarem seus serviços de compra e venda de ouro. Seja quem for, quando o interesse bate e a pergunta sobre onde a pepita sai mais em conta, a resposta permanece a mesma: Itabaiana.


O Centro de Aracaju também abriga renomadas joalherias que nasceram em solo itabaianense, se consolidaram e hoje possuem filiais dentro e fora de Sergipe. O comerciante Reinaldo Marques, 50, que atua no mercado de jóias na capital, é um carioca filho de sergipanos que se dedica a esse mercado. Há três décadas, ele tomou uma decisão importante: resolveu deixar o Rio de Janeiro e viver com a compra e venda de ouro no estado natal dos seus pais. “Quando eu cheguei aqui, o ouro de Itabaiana já era uma referência. Até hoje a maioria das pessoas que trabalham no ramo do ouro, como os ourives, por exemplo, falam que os melhores profissionais, mais antigos e experientes, e que conhecem as técnicas, boa parte são de lá”, conta.


A forma que o comércio do ouro interliga Aracaju e Itabaiana, só mostra como o metal precioso sempre será um ponto chave para a economia e para manutenção dos costumes e das relações sociais construídas durante boa parte da história da humanidade.


Na visão do professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), e doutor em Economia, Elton Freitas, a evolução das relações comerciais são observadas como precursoras do sistema capitalista, e ela possibilita que o uso do ouro siga diferentes vertentes, seja ele um “produto final”, dito no jargão acadêmico, como algo material que possa ser utilizado para várias finalidades como um acessório; um “produto intermediário”, usado para a fabricação de outros produtos; ou, por fim, uma moeda de troca. Além disso, Elton Freitas pontua que a manutenção do poder de troca do ouro, é vista como a mais tradicional, levando em consideração a sua fácil negociação, mesmo em momentos de crise e instabilidade econômica. Para entender melhor o ouro como intermediador nas operações financeiras, ouça o podcast “Penhor: a vida como valor de troca”.

O uso do ouro como acessório é atemporal e tem forte relação com status social.

Foto: Maddu Macedo


No quesito “produto final”, o ouro é muito agregado como acessório de moda. Há séculos na história, ele se caracteriza como uma linguagem universal de estilo, luxo e expressão pessoal. No Brasil, por exemplo, usar o ouro 24k em correntes, anéis e relógios confere status social às pessoas e pode passar a ideia de alto poder poder aquisitivo - um estilo que se repete, por exemplo, na identidade visual de ritmos musicais como funk ostentação e pagode, e no estilo de jogadores de futebol.


Sua presença em roupas e jóias, como alianças, anéis, correntes, brincos e acessórios, é sinônimo de elegância. A especialista em Estilo e Imagem Pessoal, Carolina Vieira, explica que a imagem de sofisticação associada ao ouro é histórica e étnica. “A ideia do ouro remetida ao luxo e poder é algo histórico e cultural. Já nos povos egípcios, etruscos, bizantinos, entre muitos outros, alguém que ostenta muitos acessórios de ouro é visto como alguém com muito poder financeiro e social”, conta. “Historicamente, a moda e sua capacidade de se adaptar às tendências contemporâneas garantem que o ouro continuará a conversar com o mundo da moda de maneira significativa”.


Na cidade de Itabaiana, por exemplo, o uso do ouro como complemento nas vestimentas e nos enfeites de ambiente é bastante predominante, principalmente nas festas locais, como a exemplo da Festa dos Caminhoneiros. Não obstante, o ouro também serve como elemento decorativo e é comum ser incorporado aos ornamentos religiosos. O Pe. Joselito Lima explica que na Igreja Católica, mesmo sem um significado espiritual específico, o ouro remete à realeza. “Antigamente, as pessoas faziam doações generosas para as igrejas, principalmente de ouro, por isso é tão comum vermos ouro em arquiteturas antigas. Dava um ar de realeza sublime”.


Por fim, Carolina também reforça que “a moda em si é o desenvolvimento dos movimentos históricos em diversas localidades do mundo, assim como o comércio e as relações econômicas foram moldados com o passar do tempo”. Por conta dessa gama de utilidades do ouro, Itabaiana segue como referência no segmento aurífero no estado de Sergipe.




Comments


bottom of page