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Casa do Beiju em São Cristóvão, a preservação de uma tradição familiar por meio de um sonho

Atualizado: 25 de nov. de 2022

Por Eduarda Julianna e Nívea Estela

 
Mulher negra aparece em foto enquadrada na  horizontal. Ela está retirando da bacia de alumínio a massa do beiju de pé de moleque e colocando na folha de bananeira para assar na chapa.
Dona Edinelde produzindo o beiju de pé de moleque. Foto: Nívea Estela.

A Casa do Beiju foi fundada há dois meses, e está localizada na parte alta no Centro Histórico de São Cristóvão, intitulada como Cidade Mãe de Sergipe. A proprietária, Edineide Santos, trabalhava na fábrica da sua família fundada há mais de 80 anos, mas sempre com o sonho de ter o seu próprio empreendimento e com bastante coragem decidiu investir no que mais sabe fazer: o beiju.


A família abriu uma fábrica, a Santa Helena, na parte baixa da cidade, há mais de 80 anos e Edineide conta que foi lá onde tudo começou. A sua avó, Dona Francisca faleceu quando ela tinha dois anos, mas aprendeu a fazer beiju com as irmãs. “Na verdade, eu aprendi com minhas irmãs, mas minhas irmãs aprenderam com a minha avó”, relata.


A sua avó no início das vendas produzia os beijus de forma improvisada, fazia a massa e as levava para assar em telhas de cerâmica aquecidas na brasa. As vendas eram realizadas na porta da fábrica e a chamavam no horário mais movimentado, o de saída dos trabalhadores.


 Letreiro em tons de verde, escrito na cor branca “Casa do Beiju São Cristóvão”, fixado em uma parede de azulejos cinza, localizada na cidade de São Cristóvão.
Fachada da Casa do Beiju, localizada na Rua João Bebe Água, centro histórico de São Cristóvão. Foto: Nívea Estela.

Muito do que ela produz hoje na Casa do Beiju vem do aprendizado na fábrica com as irmãs e a mãe. Mesmo quem não fazia beiju na família, ajudava na produção de alguma forma.


A minha mãe, na prática, nunca fez. Ela sempre soube tudo na teoria. Ela só ficava nos bastidores cuidando das coisas, da limpeza, da organização do lugar. Nunca fez um beiju na vida, mas a base era ela que fazia tudo, cuidar do coco, de colocar a tapioca para secar, era tudo ela que fazia”, conta.

Mulher negra de roupa estampada e avental branco aparece em foto enquadrada na horizontal. Ela está utilizando a máquina de ralar coco e retirando o coco já ralado caído em uma bacia de alumínio.
Dona Edineide ralando o coco na máquina para iniciar as produções dos beijus e os outros produtos comercializados no local. Foto: Nívea Estela.

E foi assim, vendo a mãe e as irmãs no trabalho da fábrica na produção do beiju que Edineide aprendeu e contribuiu para o negócio da família. Contudo essa tradição familiar por muito tempo adiou o sonho de abrir o seu próprio negócio. "Eu sempre tive vontade de fazer aqui em cima, mas nunca tive coragem de largar minhas irmãs lá para vim fazer aqui sozinha. Foi um dia assim, dei na telha e disse eu vou, aí to aqui”, relata.


A coragem surgiu e hoje tem o seu próprio empreendimento, pois viu no beiju uma fonte de renda da sua família e ampliou os horizontes ao criar a primeira Casa do Beiju São Cristóvão.


TUDO VEM DA MACAXEIRA


A riqueza e variações na forma de fazer o beiju são muitas. Esse produto é de origem indígena, tem uma herança secular e está sempre presente nas mesas sergipanas. A macaxeira é a base de tudo para fazer o beiju, a massa sempre é feita com a macaxeira e o coco, e tudo é mexido à mão para sentir bem a textura.


Mulher negra de roupa estampada e avental branco aparece em foto enquadrada  horizontal. Ela está espremendo o coco ralado e retirando o leite de coco em uma vasilha de plástico.
Dona Edineide retirando o leite do coco ralado com as próprias mãos. Foto: Nívea Estela.

Na Casa do Beiju os principais produtos das receitas, a mandioca e o coco, não são comprados na região de São Cristóvão, mas em outros municípios do estado. A tapioca usada na massa do beiju vem de Salgado e o coco vem de Pirambu.

Homem negro aparece em foto enquadrada horizontal . Ele está quebrando os cocos sentado em uma cadeira segurando em sua mão direita um martelo de ferro.
Funcionário da Casa do Beiju Mikael Santos realizando o seu trabalho de abrir os cocos. Foto: Eduarda Julianna.

O beiju possui diversas formas, sendo eles: beiju saroio de sal, beiju saroio doce, beiju molhado, beiju mal casado e o beiju de macaxeira. Todos são feitos com a mesma base, e, na hora de produzir, Edineide diz que não usa medidor, faz tudo no olho pelos anos de prática e a receita nunca falha, sempre sai tudo bem quentinho e consistente. “Não gosto de muita perfeição não, tem que tá gostoso e limpinho”, comemora.


Mulher negra de roupa estampada e avental branco aparece em foto enquadrada  horizontal. Ela está  adicionando a farinha de trigo na massa da cocada em uma tigela de alumínio.
Dona Edineide preparando a cocada de forno sem a utilização de medidores. Foto: Nívea Estela.

A CASA DO BEIJU


A Casa do Beiju funciona todos os dias de domingo a domingo, das 7h às 19h, localizada na Rua João Bebe Água, número 98. Lá o carro chefe é o beiju, mas o cardápio também traz outras iguarias. A famosa queijadinha, bolinhos de ovos, bolo de macaxeira, bolacha de goma, cocada de forno e outras delícias que também são servidas. Ainda que recente, e com a movimentação ainda inconstante, o estabelecimento já chama atenção e ganha clientes novos com o passar dos dias.


Por estar localizado na parte alta de São Cristóvão, bem próximo ao Centro Histórico, e ao lado da Casa da Xilogravura, diversos turistas visitam a região. Por ser um ambiente que comercializa produtos da culinária local, os guias de turismo já começaram a encaixar em suas rotas a passagem pela Casa do Beiju. “Os turistas sempre passam por aqui, os guias já traz para cá”, comemora Dona Edineide.


Úlo, estudante de artes visuais da Universidade Federal de Sergipe, que já virou freguesa, resolveu levar a mãe, Dona Vanilda, natural de Simão Dias, para conhecer também. “É muito diferente do beiju de lá de Simão Dias que eu como, porque a gente acha que é tudo o mesmo gosto, né? Mas é muito diferente, o tempero, o doce é diferente”, relata Úlo.


Um diferencial de ir à Casa do Beiju é comer ele fresquinho e quente, com tudo sendo feito na hora. “É diferente de quando eu como na feira, que geralmente tá mais frio. Aqui a gente come ele mais quentinho e tem mais sabor”, conta Dona Vanilda.


Edineide planeja, aos poucos, transformar a Casa do Beiju em um café e assim transformar o local em um ponto turístico onde as pessoas possam se sentar para conversar enquanto desfrutam do beiju feito na hora. Alguns clientes já comem no local, mas a maioria ainda passa lá para comprar e levar para casa.


A Casa do Beiju tem apenas dois meses de vida, mas já encanta todos que vão lá, pela delícia no sabor e pela história por trás. Dessa família de mulheres naturais de São Cristóvão, criadas na cidade baixa e que viram uma iguaria local no beiju, uma forma de sustento para a família e mais que isso, uma receita com tradição passada pelas gerações.

O processo de produção da Casa do Beiju e a mesa com os produtos que são comercializados.

Fotos: Nívea Estela e Eduarda Julianna.

 

Para saber mais sobre os beijus e a sua história, assista o nosso Webdoc apresentando pela Zona Contexto.




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