Oportunidades
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Empreendedores na Pandemia
A capacidade de se reinventar durante as crises
CARLA IASMIN FRANÇA
Crise econômica, desemprego, falta de perspectiva, uma realidade que os brasileiros já vivenciavam, antes do isolamento social imposto pela pandemia causada pelo novo Coronavírus, devido ao baixo desempenho da atividade econômica no Brasil nos últimos anos. A partir dos desdobramentos da crise causada pela quarentena, necessária para proteger a população da contaminação por Covid-19, essas tendências se tornaram mais fortes. Diante desse quadro de falta de perspectivas, muitos sergipanos e sergipanas precisaram de criatividade e jogo de cintura para conseguir manter a renda familiar. Mudar de ramo, se reinventar, adquirir novas habilidades, arriscar a entrada no mundo do empreendedorismo que apresenta barreiras burocráticas e dificuldades próprias, todos esses desafios enfrentados durante uma pandemia, um momento repleto de incertezas e instabilidade.
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No Brasil, a pandemia fez com que a maioria das atividades econômicas fossem paralisadas a partir de meados de março de 2020. De lá para cá, vidas foram afetadas em seus diversos aspectos. Além das mais de 1,5 milhão de mortes em todo o mundo, a economia global registrou o pior desempenho desde a Grande Depressão de 1929, de acordo com relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI). No Brasil, a taxa de desemprego subiu 33,1% de maio para setembro deste ano e o país encerrou o nono mês com 13,5 milhões de desempregados, segundo dados do IBGE.
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Sergipe seguiu a tendência nacional e também registrou aumento no número de desocupados nos últimos meses. Ainda segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, no mês de setembro, o estado atingiu a marca de 147 mil pessoas desempregadas, o que representa alta de 16% em relação ao mês anterior.
Na tentativa de sobreviver à crise financeira causada pelo Covid-19, muitos brasileiros recorreram a hobbies, transformando-os em fonte de renda, ou até mesmo aprenderam novas habilidades com o objetivo de manter seu sustento. Enquanto empresas de todos os segmentos e portes fecharam as portas em decorrência das complicações financeiras geradas pela pandemia, outras nasceram pela necessidade de seus donos de se reinventarem para ter uma nova fonte de renda.
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Em meio a este cenário, o número de microempreendedores individuais (MEIs) no país cresceu 14,8% nos nove primeiros meses deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado. Apesar das tendências negativas da economia, o brasileiro parece estar levando ao pé da letra a ideia de que crise gera oportunidade. Como é o caso de Karolinny, Melissa e Thaise. O que essas três mulheres têm em comum? A capacidade de se reinventar em meio a crises.
Tirando planos do papel
Aracajuana, estudante do último período de nutrição, Karolinny Guimarães, conhecida como Karol, já trabalhou algumas vezes com produção e venda de bolo de pote e brawnie, com o objetivo de pagar sua festa de casamento. Desde o ano passado, após o casório, ela e o esposo vinham estudando a possibilidade de abrir uma loja física de alimentos saudáveis e produtos naturais. “Eu tenho vários contatos de fornecedores, porque eu já comprava em grande quantidade e saía dividindo com vários amigos. Aí um dia meu pai me deu a ideia: ‘Karol, porque você não começa a cobrar por isso?’”, conta a estudante.
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No início desse ano, Karol e o esposo Felipe, começaram a pesquisar pontos para o funcionamento do negócio, mas por conta das medidas de isolamento social, resolveram adiar os planos. Em outubro, Karol resolveu tirar a ideia do papel e finalmente montar a Knutri- Produtos Naturais, entretanto, devido às circunstâncias, a loja foi construída de maneira virtual. “Veio a quarentena, a gente estacionou, decidimos esperar as coisas melhorarem, mas o tempo foi passando, passando e a gente pensou: nossa, não vamos deixar esse plano aqui no papel, porque enquanto uns estão pensando, outros estão fazendo”, ressalta a jovem de 22 anos. Karol ainda explica que quando surgiu a ideia de construir um negócio virtual, o casal que não tinha o costume de movimentar as redes sociais, decidiu comprar cursos e estudar essa nova área de vendas pela internet.
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Após menos de dois meses de funcionamento da loja, os resultados estão sendo surpreendentes, e a parceria com os fornecedores está dando tão certo que foi necessário contratar uma pessoa para ajudá-los. Além disso, os resultados positivos do negócio, fizeram com que eles adiassem a ideia de montar o ponto físico, por pelo menos mais um ano. Karol conta que, diferente das outras vezes, o fato de estarem fora do processo de produção dos alimentos, faz com que eles precisem focar apenas nas vendas e entregas, o que torna o processo menos cansativo. Quando perguntada se enfrentou alguma dificuldade com questões burocráticas na hora de registrar a empresa, ela explica que tudo ocorreu de forma tranquila, pois seu pai, que já tinha um negócio, lhe ajudou com essas questões.
A Knutri é uma das 9 milhões de MEIs espalhadas pelo Brasil. De acordo com dados do Sebrae, os pequenos negócios respondem por mais de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Juntas, as cerca de 9 milhões de micro e pequenas empresas no país, representam 27% do PIB, um resultado que vem crescendo nos últimos anos. Para o presidente do Sebrae, Luiz Barretto, a criação de novas empresas e a participação delas na economia, é fundamental para o país. “O empreendedorismo vem crescendo muito no Brasil nos últimos anos e é fundamental que cresça não apenas a quantidade de empresas, mas a participação delas na economia”, afirma Barretto.
Transformando os quilinhos que sobraram na renda que faltou
Diferente de Karol, Melissa Albuquerque(40), faz parte dos ... empreendedores no Brasil, ainda não formalizados. Ela é auxiliar administrativa no Estado, e para complementar a renda, tinha um ateliê de costuras. Com a pandemia, essa renda extra diminuiu, pois mesmo com a produção de máscaras, houve uma redução grande da demanda de encomendas.
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Ficando em casa o dia inteiro por causa do isolamento social, ela acabou ganhando peso. E foi aí que tudo começou. “Com a rotina de ficar em casa de quarentena, a gente acabou ganhando peso, foi aí que tive a ideia de fazer uma dieta e com isso aprender a cozinhar comida saudável. Comecei a fazer pra gente e a oferecer para vender marmitas fit”, conta Melissa, sorrindo.
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Durante a semana, marmitas fit, aos finais de semana, a feijoada é o carro forte da casa. Isso porque a empreendedora acredita que, assim como ela, seus clientes também tem um dia de refeição livre. Melissa também explica que, utilizando essa estratégia, tem a oportunidade de alcançar um novo público. Para ela, que nunca havia trabalhado com comida, os negócios estão indo muito bem, e os planos de continuar após a pandemia crescem a cada dia.
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Melissa é mais uma mente empreendedora espalhada por esse Brasil. Ela tem a consciência de que o mundo mudou, e a forma de encarar a vida e de consumir também mudaram. “A oportunidade de trabalhar com delivery porque as pessoas mudaram hábitos e não querem mais cozinhar no final de semana, facilitou tudo. Agora, existe uma nova forma de ver a vida e de consumir com mais facilidade e praticidade.”
Karol e Melissa são dois exemplos da capacidade de se reinventar durante momentos de crise que exigem mudança de perspectiva e a busca de novas oportunidades. Correr riscos, sair da zona de conforto, enfrentar o desconhecido não são tarefas fáceis, mas estas duas mulheres resolveram trilhar esse caminho em um momento extremamente conturbado.