Essa literatura popular cresce, conta a história dos sergipanos e já tem
até uma academia
A palavra para ser declamada
E chamar a sua atenção
Não precisa ser enfeitada
Custa somente um tostão
Em um livrinho colorido
Com uma bonita ilustração
Pendurado num cordel comprido
Não tem mistério, não
Você tira o chapéu
E ela amarra o coração.
Não tinha outra forma de começar essa reportagem. Os versos
improvisados fazem lembrar a Literatura de Cordel. Essa arte popular tem
tomado conta da cena cultural de Sergipe com muita força nos últimos anos.
Os livrinhos em cordel podem ser vistos em vários cantos. Está nas feiras, no
mercado, em escolas, nos hotéis, em centros de turismo, nos museus, em
bibliotecas, nas praças.
A Biblioteca Clodomir Silva, no bairro Siqueira Campos, em Aracaju,
possui uma sala exclusiva para essa literatura e conta com acervo de
aproximadamente 700 cordéis. Foi a primeira biblioteca do país a ter uma sala
implantada com o gênero. No Museu da Gente Sergipana, o cordel também
tem seu espaço.
A força dessa literatura é tanta em Sergipe que em 19 de julho 2017 foi
criada a Academia de Cordel de Sergipe, com 37 cadeiras de imortais dessa
arte. Essa associação tem como patrono o itabaianense João Firmino
Cabral, uma das grandes referências do cordel em Sergipe e no Brasil.
João Firmino
É impossível falar sobre cordel sem se referir ao poeta João
Firmino. Ele aprendeu a ler com os cordéis que comprava na feira. Foi paixão
à primeira vista. João Firmino escreveu seu primeiro folheto aos 17 anos. A
estória trata de uma profecia de Padre Cícero. Desde então, não parou mais de
escrever. Esse cordelista recebeu vários prêmios, um deles a medalha de
Mérito Cultural de Serigy, em 2002.
Essa literatura é tão levada a sério em Sergipe, que a capital já
tem o Dia Municipal do Cordel, lembrado em 19 de julho. A Assembleia
Legislativa de Sergipe também deve aprovar o Projeto de Lei nº 104/2019, de
autoria do deputado estadual Iran Barbosa (PT), que institui o Dia Estadual da
Literatura de Cordel, também a ser comemorado em 19 de julho. Esta data é
muito marcante para a história do Cordel em Sergipe porque foi em 19 de julho
de 2008 que o poeta João Firmino tomou posse na Academia Brasileira de
Literatura de Cordel.
A acadêmica e presidenta da Academia de Cordel de Sergipe, Isabel
Nascimento, filha do também cordelista Pedro Amaro Nascimento, mexe
com a literatura de cordel desde sua infância. Ela ouvia as declamações
poéticas de seu pai. Também ficava horas vendo Pedro escrever os
versos. Não demorou, Isabel também começou a escrever, saindo os
seus primeiros versos aos sete anos de idade. A presidenta da academia
sempre recorrer às questões sociais em seus cordéis, propondo
reflexões.
Comércio de cordel
Hoje, não se tem um número preciso de cordelistas no estado.
Também não há um cálculo sobre a quantidade de edições de livrinhos
de cordel circulando em Sergipe e no Brasil.
O poeta João Firmino viveu exclusivamente da literatura de cordel com
uma banca fixa próxima a passarela das flores, no Mercado Antônio Franco.
Após a morte do poeta em 2013, a banca está sendo administrada por seu filho
Joelson Cabral, 44 anos. Ele não escreve cordel.
Cuida só de vender, uma média de 90 livros por dia. “O cordel é tudo pra mim, pois é de onde tiro meu
sustento e de onde meu pai também tirou.”
Sintía Ferreira dos Santos é uma compradora fiel de cordel. Uma vez por
semana vai até a banca e leva sempre uma novidade para seu filho de 12
anos."Minha mãe junto com minha tia liam cordéis pra mim na infância e hoje
faço isso com meu filho. Quando leio junto com ele vem logo a memória da
minha infância”, conta Sintía.
Produção cordelista
Ronaldo Dória Dantas, acadêmico da cadeira de número cinco, já
publicou 239 folhetos de cordéis. Seus temas favoritos são infância e política.
Este ano, ele escreveu “O cangaceiro vingador” e “ Nordestino sim senhor”.
“Quando chegava à noite, meu avô juntava a garotada na porta de casa e lia
cordel para nós. Foi daí que tive meu primeiro contato com esse tipo de
literatura”, disse Ronaldo.
Francisco Passos Santos, popularmente conhecido como Chiquinho do
Além Mar, é poeta, cordelista, professor de inglês e músico. Ele escrevia
poesias desde criança, mas conheceu a fundo o universo do cordel somente
aos 23 anos, na Biblioteca Pública Epifânio Dória, em Aracaju. Lá, aconteciam
encontros de cordelistas.
A maioria das obras de Chiquinho do Além Mar é voltada para a cultura
e história de Sergipe, a exemplo de "João Bebe Água o Rebelde de São
Cristóvão"; (2005); "Cantos e encantos de Aracaju"; (2005); "A Invasão
holandesa"; (2010); "Mar Vermelho" (2007); "A Invasão Portuguesa" (2008); "Proteja o Meio Ambiente" (2008).
Chiquinho desenvolve o projeto “Cordel nas escolas” há quase 20 anos,
mas foi em 2017 que o projeto se concretizou. Hoje, 19 escolas particulares da
capital adotam três de seus livros ("Aracaju: passado, presente e futuro"; "A
história de Sergipe contada em versos"; "Sergipe e seus encantos") para o uso
didático no ensino fundamental. As obras são usadas nas disciplinas de
História, Geografia, Português e Redação.
Um pouco da história do cordel
A literatura de cordel chegou ao Brasil no século XVIII através dos
portugueses. Foi na região nordeste que teve mais influência, principalmente,
no estado de Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Pará, Rio Grande do Norte e
Ceará.
A origem do nome cordel vem da sua forma de apresentação em
“folhetos”, pequenos livros com capas de xilogravura que ficam pendurados em
barbantes ou cordas. Suas principais características são a oralidade e a
presença de elementos da cultura brasileira bem como, o uso de humor, ironia
e sarcasmo. Alguns escritores como Ariano Suassuna e Guimarães Rosa
foram influenciados por este estilo.
Produção da disciplina Laboratório de Jornalismo Integrado I - 2019.1
Repórter - Bruna Barreto
Orientação - Professores: Josenildo Guerra, Cristian Góes e Eduardo Leite
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