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  • Foto do escritorPortal Contexto

Cenário teatral de Aracaju sobrevive em incertezas

Atualizado: 28 de mar. de 2019



Aracaju não tem passado por uma situação fácil quando o assunto é a cena teatral. O ponto alto dos problemas aconteceu no fim de 2018, com o fechamento dos Teatros Tobias Barreto (reformas) e Lourival Baptista (péssimo estado estrutural). Ou seja, apenas o tradicional Atheneu está na ativa entre as casas de espetáculos.


No começo de fevereiro, a Fundação de Cultura e Arte Aperipê (Funcap) garantiu que irá se empenhar para a reforma do Teatro Lourival Baptista, junto com a Companhia Estadual de Habitação e Obras Públicas (Cehop). O fato aliviou um pouco os artistas, mas não tem sido suficiente.


A situação já é antiga em Aracaju. Em 2008, por exemplo, o Teatro Atheneu foi fechado, ficando três anos em reformas. O ator e diretor Bruno Kelvernek foi um dos pivôs do retorno da casa em 2011, com uma denúncia feita à época ao CQC, extinto programa da TV Bandeirantes. “Entrei em contato com o CQC, que veio até aqui, e 20 dias depois o Atheneu foi reinaugurado. Precisa de uma certa pressão para que as coisas aconteçam”, relembra.


O Teatro Atheneu, na Zona Sul de Aracaju, é o único aberto na capital no momento (Foto: Reprodução/Teatro Atheneu)

A precariedade dos teatros é apenas a ponta do iceberg um item da lista de problemas apontada por atores, diretores e demais envolvidos na cena teatral. Na visão deles, mesmo sendo uma capital, a cidade ainda não valoriza como deveria a área. Falta de políticas públicas para a área, pouco envolvimento do público na cena local, falta de apoio aos grupos e coletivos e cenário incerto para o futuro são apenas alguns dos dilemas.


Falta de políticas públicas para a área, de apoio aos grupos e coletivos, pouco envolvimento do público na cena local e incertezas para o futuro são apenas alguns dos dilemas.

 

Falta de políticas públicas


A ausência das políticas públicas destinadas ao teatro é alvo de bastante discussão. Em 2017, o Conselho Estadual de Cultura, da antiga Secretaria de Estado da Cultura (Secult), aprovou a votação do Plano Estadual de Cultura (PNC). O documento, que foi debatido com artistas e a sociedade, visa fomentar a produção cultural no Estado com várias ações, como promoção de eventos e apoio financeiro.

Esta é uma ajuda importante para a cena teatral de Aracaju. Porém, segundo aqueles que trabalham na área, ainda é pouco. “Ainda falta aos gestores entender que estão lá para nos servir, às vezes, a gente tem que ficar buscando ajuda, quando eles são nossos funcionários e não entendem isso”, diz Roney David, ator, diretor e fundador do grupo Catalise.


O ator Roney David fundou o Catalise, um dos grupos de teatro existentes na capital (Foto: Reprodução/Instagram)

Para os envolvidos no teatro, essa falta de percepção para políticas públicas gera vários problemas em um efeito dominó. Para o ator e diretor teatral Saulo Duque, um dos principais é a falta de público, que não apoia tanto os eventos locais como algumas peças nacionais, por exemplo. “É uma reforma geral que deve ser feita. É preocupante ver a necessidade de investir em alguns eventos para que as pessoas assistam, e ainda sem as casas estarem cheias”.


Estudante de Cinema e Audiovisual na Universidade Federal de Sergipe, ator e produtor de peças teatrais, José Edgar destaca que a falta de políticas públicas não é gerada apenas pelo pouco apoio do governo. Para ele, é necessária uma articulação entre os grupos, artistas e demais compreendidos para pleitear pelos mesmos direitos e buscar uma solução integrada. “Coloco uma mea culpa, porque nós artistas somos poucos unidos. Nossos grupos são bem segregados, e isso acontece em outros grupos de arte em Aracaju”.


Por isso, cada vez mais os artistas veem a necessidade de tentar montar seus caminhos e buscar suas próprias alternativas de continuarem na ativa. Com 18 anos de experiência e participações em Festivais Internacionais, Bruno Kelvernek é um desses casos. “Hoje tenho meu espaço, mas eu tinha uma parceria com a Secretaria de Cultura em que a gente utilizava os espaços do Lourival Baptista e do Tobias Barreto em troca de apresentações”.


Mas apesar de tantos problemas, os artistas ainda lutam para tentar melhorar a situação. É o que diz Rogério Alves, um dos criadores do Grupo Boca de Cena. “Existe uma grande fragilidade, que muitas vezes é o que causa problemas no cenário teatral. Mas a cena segue forte, com muitas pessoas tentando fazer acontecer e acreditando na arte como ferramenta de transformação”.


Rogério Alves é um dos membros do grupo Boca de Cena (Foto: Eduardo Costa)

 

Problemas com os teatros

Aracaju tem vivido um problema complicado: a falta de teatros. Atualmente o Tobias Barreto está em reforma, e o Lourival Baptista foi fechado por conta do péssimo estado. Por isso, apenas um teatro está em funcionamento, o Atheneu.

O Tobias Barreto foi fechado para reformas em agosto de 2018. De acordo com a gestão do teatro, os reparos, calculados em R$ 15 milhões e que incluem as reformas do Arquivo Público de Sergipe e da Biblioteca Pública Epifânio Dória, devem ser concluídos apenas em abril. Já o Lourival Baptista está bem pior: recém-reformado em 2013, se encontra em completo abandono e precisou ser novamente desativado.


Um dos pivôs da polêmica do Atheneu com o CQC em 2011, Bruno Kelvernek prefere não se envolver no assunto. “No caso do Lourival, quem estava lá diariamente já sabia, a coisa ia muito mal das pernas. É uma pena, mas hoje nem tenho mais forças. A gente acaba se queimando, na época me queimei com governador e prefeitura por chamar alguém de fora, então nem me meto mais”.


O fato causa indignação e gera muitas críticas dos que trabalham com o teatro. “É um espaço e um direito nosso, assim como outras estruturas destinadas à cultura. Aqui estamos sem e não há previsão de quando voltar, se isso acontecer”, destaca José Edgar.


O Teatro Tobias Barreto está fechado para reformas e a previsão é de reinauguração em abril (Foto: Reprodução/Fan F1)

Seguindo a mesma linha, Roney David lembra que os problemas não se resumem às apresentações. “Nossa grande dificuldade já é ter onde ensaiar. O Tobias Barreto e o Atheneu não dão um acesso fácil. O Lourival já é mais acessível, era a casa dos artistas. Como não temos nem onde ensaiar, e apresentação é vez ou outra pelos custos, com a extinção disso, rola uma indiferença”.


Segundo os artistas, alguns grupos acabam recebendo prioridade em relação a outros na reserva dos espaços. É o que reclama Saulo Duque. “Escolas particulares de dança às vezes alugam espaço por uma semana, e pagam um valor menor que o normal. Aí escolas e grupos recebem ‘não’ porque já foi reservado, mas é uma escola que só vai se apresentar um dia, e separa a semana inteira para ensaio”.

 

Incertezas para o futuro


O cenário para os próximos anos, especialmente com as novas articulações políticas no Brasil e em Sergipe, causa preocupação naqueles comprometidos com a arte. Com o Ministério da Cultura no Governo Federal tornando-se uma Secretaria no Ministério da Cidadania, e a Fundação de Cultura e Arte Aperipê (Funcap) unindo a Secretaria da Cultura e a Fundação Aperipê no Governo Estadual, há um receio a respeito do futuro.


No geral, existe uma grande insegurança. Roney David é um dos que apresenta receio com as fusões de Ministérios e Secretarias. Para ele, os apoios não estão garantidos e o cenário teatral não parece estar sólido neste sentido. “Me sinto inseguro com o que está acontecendo, vendo leis, direitos e Ministérios sendo cortados. É preciso estar preparado para continuar vivendo do teatro”.


Conceição Vieira é a presidente da nova Fundação de Cultura e Arte Aperipê (Foto: Ascom/Seduc)

Com uma ideia parecida, José Edgar destaca seu lado com preocupação. “Sentimos medo. Não temos muito como prever um cenário futuro, mas sabemos que vamos lutar contra isso produzindo arte, fazendo nossas articulações. Mas a única coisa que sentimos é medo”.


Alguns preferem esperar mais para opinar, como Rogério Alves. “É melhor a gente esperar para ver cenas dos próximos capítulos, até para não tomar uma decisão de emitir um discurso prematuro”, diz. Já Saulo Duque tem uma visão bem mais pessimista. “A médio prazo, vejo um caos. Já está um caos, e vejo uma piora”.

 

Importância do teatro


Diante deste cenário, todos concordam em um ponto positivo: a magnitude do teatro. Arte milenar e que conta histórias há muitas gerações (os primeiros relatos de peças com diálogos constam de 2500 a.C., no Antigo Egito), criou grandes personagens, contos marcantes, muitos ensinamentos e, no caso de atores, diretores e produtores, virou suas formas de vida.

“É meu oxigênio. Me entreguei a isso, foi uma prisão que escolhi. Ele me ensina, ainda sou um bebê e aprendo a lidar com a vida”, diz com entusiasmo Rogério Alves. Bruno Kelvernek segue uma linha semelhante. “É onde montei minha casa, minha vida, onde vivo. É literalmente a minha vida”.


Bruno Kelvernek (esq.) em um de seus projetos, a Oficina de Improvisadores (Foto: Eduardo Costa)

O teatro cria, entre várias qualidades, a empatia entre quem o pratica. É saber se colocar no lugar do outro, compartilhar experiências e entender a sociedade. “No teatro temos um grande aprendizado sempre, entre todas as idades e classes, pois cada um tem uma vivência diferente. E a gente comemora essa fusão de experiências. Quando você junta as pessoas, elas compartilham as experiências sobre tudo”, lembra Saulo Duque.

José Edgar, que é estudante de Cinema, destaca que passou a dividir suas paixões no audiovisual com o teatro. “Sou do cinema também, mas o teatro desde que passou a existir, e muito antes do cinema, causa muito impacto em quem produz e quem consome. Não consigo fazer outra coisa”.

Porém, o relato de Roney David é o que melhor retrata essa paixão pelo teatro, de fazer o que gosta e se satisfazer em vida com isso. “Digo para todos os meus amigos que procurem em vocês alguma coisa que gostem. Eu faço o que gosto, vivo do teatro, acordo dançando e cantando por mais problemas que tenho. Amo o que faço e vou lutar pelo teatro da minha forma. Quero que outros tenham essa oportunidade de fazer teatro e se apaixonar por isso. Vivo de teatro, sou teatro, é a minha vida”.


 

Produção da disciplina Laboratório de Jornalismo Integrado II - 2019.1

Repórter: Eduardo Costa

Orientação: Prof. Josenildo Guerra

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