Por: Alex Lucas Silva, Jean Felipe Rocha e Paulo Victor Almeida
© PAULO VICTOR ALMEIDA / CONTEXTO
Em cerca de um século e meio de história, Nossa Senhora do Socorro nunca havia conhecido o futebol profissional. Até 2005, a prática esportiva se limitava à informalidade dos campinhos, aos jogos nas ruas e às partidas descompromissadas entre amigos; foi apenas em agosto deste mesmo ano que o primeiro clube futebolístico nascia, a Associação Desportiva Socorrense.
Conhecido como Socorrense, o clube foi fundado por Dalmo Prata em uma reunião com donos de times de futebol amador e pessoas que eram envolvidas com o esporte em Socorro. No entanto, o clube viveu um hiato de 2005 a 2010, sem atividades. A realidade do time só foi mudar no mandato de Fábio Henrique, à época prefeito da cidade, que reformou o estádio Wellington Elias, localizado no Conjunto Marcos Freire l, e profissionalizou o clube.
Anos após a fundação do Socorrense, a cidade de Socorro ganhava outro time para rivalizar com o Siri Metropolitano. Criado em dezembro de 2018, o Sport Socorro é um dos clubes mais novos a atuar em solo sergipano. Apesar de ter pouco mais de 5 anos de fundação, o Rubro-Negro Metropolitano já participa da segunda divisão do Sergipão, apesar do atual momento não ser tão favorável.
Atualmente, Socorrense e Sport Socorro não vivem uma boa fase dentro dos gramados. Os dois clubes foram lanternas - últimos colocados - dos seus grupos na série A2 e mais uma vez não irão disputar a elite do futebol de Sergipe em 2025. Isso implica em diversos problemas que os clubes vão precisar enfrentar, no futuro, dentro e fora das quatro linhas.
Mostrando a Realidade
No mundo do futebol, milhares de jovens saem de casa em busca de realizar o sonho de se tornar profissional, porém a realidade dos jogadores de Nossa Senhora do Socorro é completamente diferente do que estamos acostumados a acompanhar. Em contraponto aos salários milionários e oportunidades que os grandes astros recebem, jogadores dos times de menor expressão costumam enfrentar jornadas árduas em busca de reconhecimento, sem o glamour que cerca os grandes clubes.
Aos 19 anos, Hebert Paulo finalmente sente o sabor de ser chamado de jogador profissional, mas até alcançar esse sonho que carregava consigo desde criança, ele teve que lidar com diversos desafios. “Enquanto treinava, eu trabalhava de frentista, mas precisei deixar o emprego para me dedicar aos treinos. Depois, consegui outro trabalho, pois precisava me manter, mas novamente tive que abrir mão dele quando surgiu a oportunidade de assinar meu contrato profissional”, enfatiza Hebert.
Depois de anos de jogos na várzea e de passagens no sub-20 de times tradicionais do nordeste, como o Náutico, ele hoje é atleta do Socorrense e disputa a segunda divisão do Campeonato Sergipano. Na primeira temporada como profissional, o jogador vive um misto de ansiedade e sonho, sentimentos comuns que acompanham todo jovem atleta sergipano.
© DIEGO CHAVES; MARLON COSTA e IGOR MATHEUS / REPRODUÇÃO
Socorrense disputando pela primeira vez a Copa do Nordeste, em 2015
O relato de Hebert mostra as dificuldades que vários jogadores enfrentam, principalmente em clubes de menor expressão, onde as limitações financeiras se tornam uma das principais adversidades. A pressão para conciliar outro trabalho com a dedicação ao esporte pode ser brutal, e muitos se veem na obrigação de escolher entre um emprego fixo que possa sustentá-los ou ir atrás de realização de um sonho.
Outra questão crítica são as condições que o estádio Wellington Elias se encontra. As duas equipes de Socorro usam o mesmo local para realizar os treinamentos e, por conta do uso excessivo do campo, o gramado acaba ficando mais desgastado. “Nos outros anos o campo ficava reservado apenas para o futebol profissional e às vezes liberava para uma final de campeonato amador. Porém esse ano está sendo direto. Todo fim de semana tem jogo e isso acaba estragando o campo”, pondera Fábio Teles, presidente do Socorrense.
O secretário de esporte e lazer do município de Socorro Júnior Panzuá comenta sobre o uso frequente do estádio. “O Wellington Elias não é somente disponibilizado para os times. Nós damos prioridade aos times porque eles representam o município lá fora, mas eles estão usando mais para treinamento, fazendo os treinos aqui e jogando fora”, elucida Panzuá.
Contudo, não é só o gramado que se encontra nessa situação alarmante. Cabines de transmissão com paredes descascando e sem luz, alambrados estragados e até vestiários com portas quebradas são alguns dos motivos pelos quais os jogos são realizados atualmente em Aracaju e não em Socorro. “Os alambrados estão estragados, tem um banheiro que não tem porta, o vestiário dos árbitros a porta não está fechando, coisas desse tipo”, pontua Fábio.
© ALEX LUCAS SILVA e PAULO VICTOR ALMEIDA / CONTEXTO
Estádio Wellington Elias tem alambrados danificados, porta quebrada e paredes descascando
Clube e Torcida
A decisão dos clubes de Socorro de realizarem seus jogos no Estádio Adolfo Rollemberg, localizado em Aracaju, que fica a 8,3 km de onde os clubes treinam, faz com que os torcedores tenham maior dificuldade em comparecer às partidas. Isso interfere diretamente no campo, visto que a torcida é parte fundamental no jogo e a principal fonte de apoio aos times.
Antigo treinador do Sport Socorro e hoje torcedor do clube, Edilson Santos fala sobre essa dificuldade. “Essa questão de não mandar os jogos lá devido às condições do gramado influencia muito. Eu já fui jogador e sei o quanto faz a diferença você estar jogando para o público poder prestigiar”.
O horário dos jogos também é outro empecilho para os torcedores. Os jogos da Série A2 do Campeonato Sergipano costumam ser em horário comercial, às 15h da tarde nos meios de semana e às 10h da manhã no sábado, diferentemente dos horários nobres, como 21:30 de uma quarta-feira ou 16h de um domingo à noite. É o que comenta Gilvan Ricardo, 48, outro torcedor do clube. “A torcida é fundamental para qualquer equipe, né? Porém temos que levar em consideração que tem jogos que são às 10 da manhã de um sábado, um horário que muitos estão trabalhando”, pontua Gilvan.
Além da ausência de apoio direto às equipes, a falta de torcida também impacta financeiramente os clubes. O presidente do Socorrense Fábio Teles fala sobre essa questão. “Quando a gente joga em Aracaju, às vezes temos que ir atrás de uma ambulância para o jogo, pagar uma técnica de enfermagem, pagar gandula, maqueiro. Isso tudo aumenta a despesa para o clube”.
O presidente do Socorrense faz, ainda, uma analogia saudosa ao tempo que o time mandava os jogos na sua cidade. “Já quando os jogos eram em Socorro a gente não precisava se preocupar com isso. Colocávamos o ingresso a 10 reais e entre 100 a 150 torcedores compareciam aos jogos, isso já pagava algumas despesas do clube como a passagem dos jogadores”, destaca Fábio.
© PAULO VICTOR ALMEIDA / CONTEXTO
Devido à distância, poucos torcedores comparecem aos jogos dos clubes em Aracaju
Esperança no Futebol
A situação do futebol em Nossa Senhora do Socorro é um reflexo dos desafios enfrentados por muitas equipes Brasil afora. Todavia, o futebol vai muito além de ser uma mera prática esportiva para jogadores como Hebert, ele representa um meio de transformação e realização pessoal.
O psicólogo esportivo Cristiano Lima comenta sobre a importância da prática esportiva na vida de um atleta: "A prática esportiva te força a desenvolver habilidades em vários setores da sociedade. Dentro das organizações atuais, uma das grandes dificuldades é o comportamento interpessoal, saber trabalhar em equipe, e o esporte te força a desenvolver habilidades psicológicas que podem ser usadas em outros âmbitos da vida. Isso vai fortalecendo o caráter e estruturando o atleta”.
Jogadores como Hebert Paulo representam essa luta, superando obstáculos dentro e fora das quatro linhas, na busca por um sonho que, apesar dos desafios, vê no futebol um caminho de transformação. “Eu ainda tenho o sonho de me tornar um atleta de alto nível. A minha maior motivação é o sonho de realmente querer isso”, reitera Hebert, esperançoso.
O futuro ainda é incerto para os clubes de Socorro, mas a vontade dos jogadores e o apoio dos torcedores, mesmo à distância, são o combustível que mantém viva a esperança do futebol socorrense voltar aos dias de glória. O futebol de Socorro não é só sobre vitórias ou derrotas; é sobre resistência, luta e o sonho de dias melhores.
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Excelente matéria👏🏽 , o futebol sergipano agradece !
Que matéria incrível!
Na torcida pelos times de socorro se reerguerem 🙏🏽