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Um homem

a um tempo sério e gentil

Rosalvo Ferreira, vice-reitor da UFS, esconde por baixo de seu traje fino um coração sensível

 

Por Elaine Olimpio e Jane Miranda

          Ele tinha tudo para ser um homem sisudo, sério, de poucas palavras e classificado como um intelectual. Cabelos grisalhos, menos na coroa, demonstram quantas histórias cada fio caído já vivenciaram. Seu corpo magro e frágil revela que ele não é adepto a atividades físicas ou ao esporte, apesar de gostar muito de jogar futebol. Sentado em seu escritório, ele parece concentrado em seus afazeres, mas poucos imaginam que por trás desta capa, o professor e vice-reitor da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Rosalvo Ferreira, é um homem sensível e aberto aos outros.

          A sensibilidade se mostra, dentre outras coisas, em seu gosto pela arte. Um dos seus anseios era saber tocar algum instrumento musical clássico, que infelizmente não conseguiu desenvolver a habilidade. No entanto, Rosalvo se saiu muito bem como economista e administrador. Quem prova isso é a sua mesa de trabalho, cheia de papéis, canetas, documentos e planilhas.

          E, como visto, Rosalvo se mostra gentil, esbanjando simpatia, e com uma piada na ponta da língua, mas só depois de uma boa conversa. Há casos em que as piadas podem ser mal interpretadas, mas no caso do professor, as anedotas e brincadeiras são eufemismos e rapsódias, em forma de interlocução agradável.

Apesar da posição de trabalho que ocupa atualmente, pode-se dizer que ele vive de duas formas: uma versão mais, digamos, sofisticada, que gosta de desfrutar de vinhos e alimentos chiques, e outra de coração aberto ao mundo, com paixões e feridas.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Calça de alfaiataria e sapato social 

          Estresse e responsabilidade, essa combinação se manifesta em Rosalvo no olhar e linhas de expressão, bem visíveis por trás do seu óculos de grau. Mas, quando se sente sobrecarregado,  ele sai para dar uma caminhada pelas ruas do bairro onde mora para refrescar a mente. Ele mesmo disse que em casa resolve pendências do trabalho. "Não é porque eu estou em casa que deixei de ser vice-reitor", desabafa.

          As roupas finas, sapato social e calça de alfaiataria são testemunhas de rotinas corridas. Sair de uma reunião, atender alunos, ir à aula, ir para casa, fez dele um Rosalvo robusto e seco, mas que, agora, tenta ser resiliente. "Qualquer coisa que falavam e me contrariavam, eu me exaltava, abandonava ou desistia. Já cheguei a ser arrogante e agressivo por ser contrariado", se descreve, um homem obstinado.

          Ainda assim, pode se dizer que o vice-reitor não tem papas na língua. Quando não gosta de alguma coisa, ele não mede palavras e é incisivo, sendo o mais sincero possível. "Eu não tenho receio de dizer e não consigo esconder a fisionomia quando estou chateado."

         

 

           Mesmo tendo uma vida financeira atraente, Rosalvo travou algumas lutas, tanto pelo crescimento pessoal, quanto por um futuro próspero na sociedade, com mais equidade. Desde o ensino médio, ele se empenha nas causas sociais, influenciado por uma de suas professoras de história, Joana. O Rosalvo jovem, cheio de energia, pensava que poderia ser professor de história, para explorar esse seu lado militante. Muitas idas e vindas surgiram de lá para cá, e ele tomou outros rumos acadêmicos. Por critério de proximidade, e do que gerava mais emprego naquela época, optou por se aperfeiçoar no curso de contabilidade na Paraíba. "A melhor sensação foi quando eu estava dentro de um tonel de água em casa, lá em Campina Grande, onde nasci, e eu percebi que meu cabelo estava todo picotado, foi quando caiu a ficha! Que felicidade, passei no vestibular!”, relembra. Daí em diante, Rosalvo não saiu mais de dentro de uma universidade, seja como aluno, professor ou gestor.

          Professor Rosalvo, como prefere ser chamado, tem clara relutância à rotina massiva, isso não combina com seu dinamismo, ele sempre procura diferenciar a pauta do dia, o que poderá observar de diferente. Andando pela UFS, ele tem o mapa do campus em sua memória, sabe dizer onde fica cada lugar sem precisar de muitas explicações. Ele conta que vive mais para o trabalho do que para a vida pessoal, resolvendo demandas da gestão ou participando de eventos e palestras.

       

 

         Seu gabinete de trabalho é bem arrumado, a única coisa fora de lugar são os muitos papéis desordenados. As estantes são repletas de livros e xícaras de enfeite, diferente dos copos de café que toma durante o dia, na vivência do Campus. Falando nisso, ele se considera um bom degustador, sabe diferenciar um café ruim para um bom com apenas um gole, e consegue reconhecer até se o café ficou tempo a mais na cafeteira. Os seus preferidos são os  cafés estrangeiros e expressos, quentinhos e na medida certa. Apesar de dizer que não gosta de monotonia, tomar seu cafezinho é a única coisa que lhe dá prazer de repetir sempre, mesmo sofrendo de gastrite. 

          Para ministrar as aulas, às terças e quintas, o vice-reitor sai do gabinete sem sequer um papel em mãos. Ele pode não preparar slides, apostilas ou aulas elaboradas, mas é um homem apaixonado pelo conhecimento. Inclusive, ele se dedicou a estudar outras línguas também, como o francês, inglês e espanhol.

Além disso, o que mais importa para ele é ter uma relação afetiva com os alunos . "Orientar aluno quando ele tem interesse é a melhor coisa. Na verdade, a melhor coisa é ver o aluno ter mais sucesso que ele", se emociona.

 

 

 

 

 

 

Antes do gabinete

          O professor Rosalvo sempre demonstrou ser um bom garoto, nasceu e cresceu em Campina Grande, na Paraíba. Com ele, somavam-se quatro irmãos na família de Rosalvo. Mas, logo cedo, ele teve que lidar com a perda da irmã, de apenas seis meses de vida, e em seguida com a morte do pai, ainda na infância. Assim, Rosalvo ficava cada vez mais apegado à mãe. "Quando ela ia tomar banho, tinha que deixar a porta do banheiro aberta porque se eu não a visse, começava a berrar. Eu era muito dependente emocional, todo canceriano de modo geral é assim", brinca, mesmo não acreditando em astrologia. 

          Carregando nas costas sofrimentos precoces, Rosalvo cresceu e foi o único da família a querer fazer faculdade. Quando chegou em Aracaju, em 1997, ele prestou concurso para lecionar no curso de economia, na UFS, passou e logo se estabeleceu na cidade. De início, o professor  gostou do novo lugar, pensava ser uma cidade mais desenvolvida, turística, mas a expectativa tinha sido alta demais. Ainda, ele e a esposa trouxeram na mala a tristeza e a dor da perda precoce de um filho, ainda na fase inicial de gestação, pouco antes da mudança. Mas, logo, eles se reergueram, e Rosalvo estabeleceu sua vida em terras sergipanas, onde mora até hoje.

          Só que o primeiro casamento de Rosalvo não vingou. Porém, o luto do fim do relacionamento não foi suficiente para que ele desistisse do amor. Em seu segundo casamento, o vice-reitor viveu uma vida feliz por um tempo, gerou dois filhos e uma filha, e se separou uma vez mais. Hoje, Rosalvo é um homem solteiro, apesar de viver em harmonia com a mãe dos filhos. Sobre a relação com os filhos, Rosalvo diz ser muito permissivo, mas, ao mesmo tempo, desejava que eles fossem como ele, que aproveitassem as oportunidades que teve, coisa que nem sempre acontece.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Além do café, MPB e poesia

          É evidente que o vice-reitor é um homem de paixões. Dos vinhos importados às belas artes, ele também gosta de escutar Música Popular Brasileira (MPB) em seu tempo livre. Chico Buarque, Luiz Gonzaga, Odair José, esses são alguns dos artistas favoritos do professor Rosalvo. Além de apreciar uma boa MPB dos anos 60, mais uma das paixões do professor Rosalvo é escrever. Quando ainda não existiam telefones digitais e computadores que pudessem registrar suas produções, Rosalvo comprou uma máquina de datilografia para documentar as poesias que escrevia. Até hoje, ele mantém o hábito da escrita. Rosalvo conta que escreve razoavelmente bem e tem facilidade de expressar aquilo que sente  em palavras. Tanto que, aos 20 anos de idade, “se deu” de presente uma máquina de datilografia. “Comecei escrevendo todo domingo para um jornal, e eu cheguei a ganhar um prêmio de algo que escrevi sobre a minha separação", detalha. 

          O professor explicou que naquele primeiro casamento dedicava muitas produções à mulher amada, pois era a sua forma de demonstrar a paixão. Com o tempo, ele percebeu que só um lado estava apaixonado, e que, quando se deu conta de que o amor que sentia não era recíproco, pediu os poemas que escreveu para para a ex-esposa de volta e rasgou todos, um a um. Mas, ao mesmo tempo que sofria, Rosalvo escrevia, e passava o sofrimento para os papéis. Aos poucos, no entanto, passou a investir mais em razão do que emoção; ainda que tenha abandonado a produção contínua de poesias, segue escrevendo.

 

Penumbra

Rosalvo Ferreira

 

Finjo ser o que sou.

Abro-me como flor de cacto

no deserto da minha alma.

Cativo o som inaudito

das minhas palavras.

Sou efêmero e translùcido 

como uma noite cinza.

Quem dera fosse inverno

e feito rosa do deserto

adormecesse

à espera do cáustico sol

prá vicejar.

O vice-reitor mostra e explica algumas funcionalidades da UFS. Foto: Elaine Olímpio

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Um olhar firme e pensativo quando o professor Rosalvo fala sobre a família. Foto: Jane Miranda

A mesa de um gestor de universidade pública.

Foto: Jane Miranda

Sereno, Rosalvo conta sobre o seu dia a dia.

Foto: Elaine Olímpio

Uma estante cheia de histórias que conta a vida do professor. Foto: Jane Miranda

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