Revelando histórias,
desvendando o invisível
Provar uma empada de aratu, patrimônio cultural e imaterial do estado, é um dos motivos que levam turistas à Terra Caída, vilarejo de Indiaroba, localizado a 100km da capital sergipana. Em Aracaju, saindo do Terminal Rodoviário Luiz Garcia, é possível encontrar passagem para Terra Caída por R$21 reais. O percurso é longo, mas a beleza do trajeto, que passa pelas praias da Caueira, do Abaís e do Saco, já faz a jornada valer a pena. Depois de quase duas horas, o letreiro da ponte Gilberto Amado, sobre o Rio Piauí, indica a proximidade do destino final e proporciona uma primeira visão das águas do vilarejo, encerrando a viagem com uma promessa de que mais beleza está por vir.
Mas a comodidade da ponte e da viagem de ônibus nem sempre foi assim. Para os moradores mais antigos de Terra Caída, atravessar o Rio Piauí envolvia muito mais do que utilizar um ônibus ou carro. Segundo o pescador Raimundo Pereira, sair do vilarejo significava programar, no dia anterior, a quantidade de gasolina que seria utilizada no barco e a alimentação, já que a viagem era mais longa. Cruzar a ponte Gilberto Amado – a maior ponte sobre águas fluviais do Nordeste – carrega não só marcas de uma transformação visual ao longo do tempo, como também permite que novas pessoas acessem com mais facilidade essa comunidade cercada por águas.
Um povoado que prefere ser chamado de vilarejo, rodeado por águas que se misturam, se confundem e que apenas os nativos conseguem distinguir. O Rio Indiaroba encanta os turistas que chegam na orlinha do povoado e, mais a frente, se mistura com a imensidão do Rio Piauí, que separa os municípios de Estância e Indiaroba. Já mais distante de Terra Caída, na altura de Mangue Seco, os rios Piauí e Real se fundem, criando uma fronteira natural entre Sergipe e Bahia.
Em terra, as portas abertas são símbolo da boa hospitalidade e da vida calma que, mesmo com o turismo crescente, é característica do vilarejo. No fim da tarde, é possível ouvir os pescadores reunidos, limpando os peixes e conversando sobre o dia de trabalho, às margens do Rio Indiaroba. Perto dali, um aratu gigante chama atenção para outro símbolo de Terra Caída, que além da biodiversidade e da culinária, é importante para a economia e para o turismo do vilarejo.
Os tipos de pesca no vilarejo dependem muito do horário, às vezes muitos pescadores saem de manhã cedo, à tarde ou também à noite. E nessa variação de momentos é possível encontrar diversas espécies de pescados como tainhas e robalos. José Alves, pescador, conta como são essas pescas e o que cada maré representa. “É na maré alta que tem peixes maiores. E na maré baixa se pega peixes miúdos”, conta José. Os pescadores utilizam diferentes métodos de pesca, mas é a pesca artesanal, com redes e anzóis, que predomina na região.
Em Terra Caída, a pesca não é só uma atividade de consumo, mas também a principal fonte de renda do vilarejo. A venda do pescado é uma parte da economia local, que movimenta e circula cada produto diretamente para restaurantes, moradores da região e para fora do vilarejo. Essa atividade proporciona sustento para as famílias dos pescadores e fortalece laços entre a comunidade.
Situado na região Sul do estado, o vilarejo de Terra Caída conta com cerca de mil e quinhentas pessoas e é uma pequena comunidade pesqueira formada por famílias que permanecem na região há gerações. É o caso do pescador Raimundo Pereira, já citado anteriormente, que ao falar sobre sua relação com as águas e o vilarejo, resume a vida como pescador em uma frase: “Minha vida é a pesca, e é o que eu sei fazer, é o que gosto e não quero ser mandado por ninguém”.
Fotos: Júlia Cavalcante
A proximidade com três rios faz a economia e a comunidade de Terra Caída serem voltadas para as águas e, consequentemente, para a pesca
Ao ser perguntado sobre a família, ele conta que seus 11 filhos não quiseram seguir a tradição da pesca, saíram da cidade e hoje moram em São Paulo. Com 55 anos, seu Raimundo lembra que teve de aprender a pescar para ajudar a família na época. “Não me arrependo de nada. Todos os dias eu vou atrás da minha única fonte de renda, que é a pesca”, afirma ele.
Ao contrário de seu Raimundo, José Mazê, conhecido como “Burro”, passou para seus filhos e netos a tradição da pesca, herdada do pai. “Desde os 10 anos que eu pesco. Criei meus filhos com a pesca. É divertido, eu gosto”, conta. Hoje com 73 anos, seu Burro deixou a atividade recentemente, após a morte de sua esposa, que pescava junto com ele. “Terra Caída hoje é uma cidade”, conta, mencionando as transformações em sua comunidade. José Mazê demonstra muito orgulho ao falar sobre a terra onde nasceu e deixa claro: “Só saio daqui quando eu morrer”.
Foto: Janisse Bispo
José Mazê, conhecido como seu Burro, é famoso em Terra Caída pela sua simpatia e pelas suas histórias construídas ao longo dos 63 anos em que trabalhou como pescador.
Essa paixão pelo vilarejo é muito comum entre seus habitantes, principalmente entre os mais velhos, que viram o lugar onde cresceram se transformar. Por ser um vilarejo pequeno, onde todo mundo se conhece ou possui algum grau de parentesco, mesmo que distante, figuras como seu Burro e dona Maria Lúcia, a marisqueira mais velha de Terra Caída, são patrimônios dessa comunidade acolhedora, que têm se modificado nos últimos anos.
Foto: Júlia Cavalcante
Terra Caída é cercada por manguezais, local onde as marisqueiras tiram seu sustento
MULHERES QUE TRANSFORMAM O ARATU EM SUSTENTO
Maria Lúcia é uma das personagens desta pequena comunidade pesqueira. Apesar de ter nascido no povoado Porto do Mato, em Estância, do outro lado da Ponte Gilberto Amado, ela vive em Terra Caída há cinco décadas. Quando recebeu o +Contexto em sua casa, dona Lúcia tinha acabado de completar 84 anos, sendo 72 deles dedicados à vida de marisqueira.
Após mais um dia de trabalho no mangue, ela conta que começou a pescar aratu com 12 anos, ainda na sua cidade natal. Maria Lúcia foi morar em Terra Caída após se separar do pai de um dos seus filhos, e foi do mangue que ela tirou o sustento de sua família, vendendo o aratu já catado para compradores e donos de restaurante da região.
“É de segunda a segunda. Quando eu ‘tô’ cansada, eu digo: eu não vou não, eu vou quebrar”, explica. Apesar da idade avançada, dona Lúcia atravessa até o mangue a pé e sozinha, um percurso que é considerado por muitos como corajoso, por ser longo e cansativo. “Eu vou com a maré cheia, fico pescando pela beirada. Quando a maré vai vazando, eu vou descendo”, relata. Ela conta que os filhos lhe dizem: “Mãe, vá descansar”, ao que ela responde: “Eu vou descansar no mangue”. Para muitos, a jornada de Maria Lúcia pode ser interpretada como solitária ou triste. Para ela, a música e suas orações a acompanham.
Vídeo: Carol Izidoro
Aos 84 anos, Dona Maria Lúcia é a marisqueira mais velha de Terra Caída.
Mas a jornada de dona Maria Lúcia não é comum entre as marisqueiras. De acordo com Ana Elísia Pereira, representante do Movimento das Marisqueiras de Sergipe e da Associação pela Cidadania dos Pescadores e Moradores de Terra Caída, as marisqueiras não costumam andar sozinhas, por conta da distância até o manguezal e pelos perigos que elas podem encontrar pelo caminho. “A gente já teve casos de estupro dentro do mangue, casos de marisqueiras que foram atacadas por abelhas, de serem engolidas por um ‘sumidouro’ [é o ponto em que um curso d'água superficial penetra no solo] e não ter ninguém para ajudar, para puxar”.
Como as marisqueiras passam o dia inteiro dentro do mangue, a união dessas mulheres é fundamental. “A gente aconselha elas a nunca andarem sozinhas, principalmente as que vão a pé, porque elas atravessam matas, sítios. Elas sempre andam em grupos”, complementa.
O REI DO MANGUE
Foto: Júlia Cavalcante
O aratu é capturado para consumo humano e é um ingrediente essencial em pratos tradicionais da culinária sergipana, como a empada de aratu.
Em Terra Caída, vilarejo que se sobressai por sua criatividade na culinária, o aratu caçado por mulheres como dona Maria Lúcia é mais do que um simples crustáceo; trata-se de ingrediente fundamental que atrai turistas em busca de experiências gastronômicas. Além da empada, hambúrgueres e almôndegas de aratu, carregam consigo histórias de tradição e apreciação pela riqueza natural da região.
A empada de aratu, em particular, conquistou um lugar especial no paladar e no afeto dos habitantes de Terra Caída, sendo reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial através do Projeto de Lei n° 277/2021. Para os moradores, não é apenas um prato; é um símbolo de orgulho e pertencimento, uma celebração da riqueza culinária que o aratu proporciona à comunidade.
Nas mesas das residências locais, o aratu transcende sua função como alimento; é uma expressão de generosidade e hospitalidade, uma maneira de acolher visitantes. A reportagem chegou a ser convidada a saborear a iguaria assim que chegou ao vilarejo e pôde confirmar: é maravilhosa!
Terra Caída foi a primeira experiência do turismo de base comunitária em Sergipe, mas apesar da atividade turística ter se desenvolvido com mais força nos últimos anos, principalmente a partir da construção da ponte Gilberto Amado, a principal atividade econômica do vilarejo continua sendo a pesca. E para a turismóloga Viviane Castro, é importante para a comunidade que permaneça assim. “O turismo não deve ser a primeira atividade do grupo. As primeiras atividades que eles desempenham devem continuar sendo as principais, pois essas atividades são os atrativos”, explica. Se a comunidade deixar a pesca pelo turismo, projeta a pesquisadora, quando os turistas chegarem, não irão encontrar os maiores atrativos, que são as características do lugar.
O turismo de base comunitária é uma forma de desenvolver o turismo numa comunidade de uma forma inclusiva, com a participação ativa da comunidade local na gestão, desenvolvimento e benefícios da atividade na região. Então, ao invés de serem apenas espectadores ou beneficiários passivos desse processo, os moradores de Terra Caída são peças centrais da atividade, o que contribui para a experiência dos visitantes e para o desenvolvimento sustentável da comunidade. Na avaliação de Viviane, o turismo de base comunitária contribui para a preservação da vida em Terra Caída, por priorizar a sustentabilidade do espaço e da cultura local.
QUANTO VALE UMA MOEDA ARATU?
Em Terra Caída, o aratu não é só ingrediente principal de muitas receitas, nem só espécie do bioma e fruto do trabalho. Nos estabelecimentos comerciais, placas avisam que, em Indiaroba , o aratu também é uma forma de pagamento aceita no comércio local. De primeira, quem é de fora acha que é um tipo de escambo, mas na verdade, o aratu é moeda local desenvolvida e validada pelo Banco Central do Brasil (Bacen).
A moeda de aratu está vinculada ao Banco Popular de Indiaroba, o primeiro nesta modalidade em todo o Norte e Nordeste. Segundo o prefeito Adinaldo Nascimento, a moeda foi batizada com o nome do crustáceo como forma de homenagear um dos maiores produtos do comércio local e fazer com que os moradores da cidade movimentassem, através das suas compras, a própria economia. “Já distribuímos mais de 600 cartões do nosso banco virtual. Se você perceber, na porta dos estabelecimentos já existem placas falando que aceitam em Aratu. Ele tem o mesmo valor do real, mas só funciona no nosso município”, explica.
A moeda social é uma forma de dinheiro alternativo criada e gerida dentro de uma comunidade específica, com o objetivo de fortalecer os laços sociais e promover o desenvolvimento de uma região. O economista Danilo Paske, sócio da Criteria Partners, explica que, quanto mais robusta for uma economia local, mais preparada essa região está para passar por uma crise. E pontua que uma vantagem da moeda aratu é a redução dos custos nas transações em débito ou crédito, uma vez que as taxas aplicadas às operações financeiras são menores. “A economia local é a base da pirâmide, e sabemos que são as pessoas de baixa renda que mais sofrem em uma crise. Portanto, se estiverem com saúde financeira, terão menos dificuldades ao passar por uma crise”, pontua.
A ideia de criar o Banco Popular de Indiaroba surgiu após uma experiência desafiadora com a plataforma inicialmente utilizada para transações do Bolsa Família municipal. Em 2021, essa plataforma cobrava uma taxa de 4,5% por transação aos comerciantes, resultando em atrasos significativos no recebimento dos pagamentos. Além disso, a adesão dos comerciantes foi baixa, com apenas 13 aderindo ao sistema. Diante dessas dificuldades, a concepção de um banco municipal, com a taxa de transação reduzida para 2% e garantindo pagamentos automáticos aos comerciantes, resultou em uma adesão muito superior às expectativas, com 290 estabelecimentos participando ativamente e recebendo a moeda social.
Para Lauro Oliveira, gerente do Banco Popular de Indiaroba, a escolha do nome ‘aratu’ teve um motivo bastante especial. "A nossa cidade tem algumas bases econômicas, que geram renda para as famílias, e uma das principais é das mulheres que são marisqueiras aqui no município, que sustentam suas famílias com o trabalho árduo de ir até os mangues para capturar os aratus, cozinhar e retirar a carne do caranguejo para vender nas feiras livres. São inúmeras mulheres aguerridas que têm esse papel econômico em nosso município que é ribeirinho. E também por ser uma iguaria o consumo dele em nossa região. Por isso que foi escolhido o aratu para nomear a moeda social, homenageando as marisqueiras", explica.
Quando a prefeitura de Indiaroba anunciou o lançamento da moeda, muitos moradores foram em busca de entender melhor como ela funcionava e acreditaram que seria uma boa maneira de estimular o comércio local. Foi o caso do comerciante André Camargo, dono de uma sorveteria artesanal no vilarejo. “Quando recebemos em aratu, utilizamos dentro do município. Eu tenho preferência de utilizar dentro do povoado de Terra Caída, assim o dinheiro gira por ali mesmo. Quando preciso também consumimos em outros pontos do município em que a moeda é aceita”, afirma o comerciante.
AMEAÇAS AMBIENTAIS
Foto: Mavi Pereira
A instalação de viveiros não licenciados pode afetar o ecossistema e a pesca na região.
Apesar da importância do aratu e dos pescados em geral, a subsistência do vilarejo, que continua pacato e voltado à pesca, tem sido colocada em risco pela criação de novas áreas imobiliárias e de viveiros de camarões. Esses dois fatores, somados ao aumento da temperatura da água dos seus rios, motivado pelo aquecimento global, têm afetado atividades tradicionais da comunidade, como a pesca e a mariscagem, uma vez que os empreendimentos ocupam espaços próximos aos mangues e aos rios.
Alguns pescadores, como José Alves e Maria Lúcia, notaram que a quantidade de mariscos e pescados diminuiu em comparação há alguns anos. “Antes, minha filha, eu ia para o mangue e voltava com três baldes e um saco [cheios de mariscos e aratus], hoje em dia só volto com um saco. Foi-se o tempo em que eu pegava três vezes mais do que hoje”, conta a marisqueira Maria Lucia.
A popularidade do Aratu, que movimenta o turismo e a economia, pode se transformar em ameaça ambiental. O crescimento da procura pelo aratu, seja ele cru, na empada ou na moqueca, fez os marisqueiros alterarem as técnicas para a caça do crustáceo. O uso de lanternas permite que a captura, antes feita somente pelo dia, passe a ser realizada também no período da noite. Essa técnica, entretanto, atrapalha seu ciclo reprodutivo e compromete a preservação da espécie.
Para a professora do Departamento de Engenharia de Pesca e Aquicultura da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Ana Rosa Araújo, essa diminuição observada pelos pescadores e marisqueiras tem um motivo. Se antes os mariscos eram catados somente pelo dia, eles tinham tempo para crescerem e se desenvolverem, e ao passar a ser procurado dia e noite, o cenário mudou. “Quando você não permite que o aratu ou qualquer outra espécie marítima tenha seu próprio tempo de crescimento e aumenta a demanda na quantidade catada, você vai fazer com que eles comecem a entrar em extinção, pois ficarão cada vez menores, até desaparecerem”, explica.
Outra atividade que impacta o ecossistema local é a criação de camarões em viveiros. Em Terra Caída, como em outras áreas do território sergipano, as disputas envolvendo a carcinicultura são complexificadas pela quantidade de dinheiro movimentado. Dados do IBGE divulgados em 2020 indicam que a carcinicultura gerou uma renda de R$ 83 milhões de reais e fez Sergipe se tornar o segundo maior produtor do país.
Por mais que a legislação brasileira considere a carcinicultura como uma atividade que gera um impacto pequeno ou mediano, o espaço dos viveiros faz um uso intenso de água retirada de rios e mares e, de tempos em tempos, devolve essa água aos espaços de origem repleta dos resíduos resultantes da criação intensiva dos camarões.
Em alguns casos, há a aplicação do metabissulfito de sódio, uma substância que, em contato com a água, sofre uma reação química e libera o gás dióxido de enxofre. O material age para impedir que manchas negras surjam nos camarões, tornando-os menos propícios à venda - a substância, vale dizer, é considerada extremamente prejudicial à saúde e ao meio ambiente, segundo o Ministério do Trabalho.
A situação pode se agravar ainda mais em caso de viveiros irregulares, isso porque eles costumam desmatar Áreas de Preservação Permanente, como os manguezais, além de que, sendo irregulares, não há controle sobre o uso de substâncias e sobre o despejo dessas substâncias.
Procurado pelo +Contexto, o presidente da Administração Estadual do Meio Ambiente (Adema), George Trindade, afirmou que a carcinicultura é uma atividade economicamente importante para o estado, capaz de gerar emprego e renda para a população que subsiste dela.
Sobre os viveiros que mantêm funcionamento não licenciado, o executivo ponderou que, quando a Adema toma conhecimento, por meio de denúncia ou de fiscalização ordinária, o órgão emite auto de infração para o proprietário. “Se a área for passível de licenciamento (permitida pela legislação para a atividade), a Adema notifica para que o proprietário regularize o empreendimento dando entrada na Licença de Regularização de Operação. Se a área não for permitida, é determinado o encerramento da atividade.”
O procedimento do órgão, como descrito por Trindade, mostra que os viveiros que começam a funcionar de forma irregular, isto é, sem um pedido prévio de autorização são beneficiados. Desde que não estejam em área proibida, o procedimento segue para uma regularização e não para o impedimento da iniciativa que começou sem a autorização devida, sem estudo de impacto e sem fiscalização quanto aos resíduos.
Além disso, a capacidade de fiscalização ordinária da Adema também pode ser comprometida diante do crescimento do número de viveiros. Em outras regiões do estado, como no município de Nossa Senhora do Socorro, a presença de mais de trinta viveiros sem licença e sem processo de regulamentação funcionando em região de manguezal fez o Ministério Público Federal em Sergipe pedir à Justiça que proíba novas licenças ambientais para a atividade no município da região metropolitana de Aracaju.
Seu Chico, morador do povoado e dono de um viveiro de camarões, explica que o valor para tirar o licenciamento do seu viveiro foi de 7 mil reais, mas o lucro obtido é muito maior. “De 70 em 70 dias, eu tiro 10 mil reais e gasto 3 mil com os cuidados”. Mesmo possuindo um viveiro regularizado, Chico não concorda com a prática por causa do desmatamento. A quantidade de camarões retirada é proporcional ao tamanho do viveiro e, com isso, quem pratica a carcinicultura de forma inadequada, destruindo o ecossistema ao redor para aumentar a área explorada, acaba adquirindo um valor muito maior.
Mesmo sendo uma atividade lucrativa, as consequências da carcinicultura não podem ser omitidas entre os seus custos. Os viveiros de camarão podem gerar destaque para o estado e riqueza para alguns, mas põem em risco o mangue de Terra Caída e, com ele, seu Aratu. Os custos incluem, então, os baldes vazios de Maria Lúcia e colocam em risco o modo de vida do vilarejo.